Trafigura se declara culpada por pagamento de propina no Brasil e é multada em US$ 127 milhões

Empresa apareceu em investigações da Operação Lava Jato em 2018, e reconheceu ter feito pagamentos a autoridades em troca de contratos com a Petrobras. Multa foi acordada com o Departamento da Justiça dos Estados Unidos.

 

Por g1

29/03/2024 16h13  Atualizado há 52 minutos

 

A Trafigura, empresa suíça de negociação de commodities, declarou-se culpada à justiça dos Estados Unidos pelo pagamento de propina a autoridades brasileiras para garantir negócios com a Petrobras. (veja o posicionamento da empresa ao final desta reportagem)

 

A informação é do Departamento de Justiça (DoJ) norte-americano, que conduzia uma investigação sobre a conduta de ex-funcionários e agentes no Brasil há 10 anos ou mais. O órgão não divulgou quais executivos foram subornados.

 

Para fechar a investigação, a companhia concordou em pagar cerca de US$ 127 milhões pelas violações da Lei de Práticas de Corrupção no Exterior (FCPA, na sigla em inglês). O pagamento será feito pela Trafigura Beheer BV, empresa controladora do Grupo Trafigura durante o período, como parte do acordo de confissão.

 

O esquema foi inicialmente revelado no âmbito da Operação Lava Jato. O nome da empresa surgiu ao lado de Vitol e Glencore na 57ª fase da investigação, que apurava o pagamento de propinas a funcionários da Petrobras por empresas que atuavam na compra e venda de petróleo e derivados — atividade conhecida como trading.

 

De acordo com documentos obtidos pelo Departamento de Justiça dos EUA, a Trafigura mantinha relações comerciais com a Petrobras entre 2003 e 2014. Em 2009, informa o DoJ, a Trafigura acertou um esquema de suborno que pagava até US$ 0,20 por barril de produtos petrolíferos comprados ou vendidos da Petrobras.

 

Foto de 2012 mostra a fachada do prédio onde a empresa suíça Trafigura tem seus escritórios, em Genebra. — Foto: Reuters/Denis Balibouse/Foto de arquivo

 

Os pagamentos eram ocultados por empresas de fachada, direcionados a contas bancárias offshore para os funcionários da Petrobras no Brasil. De acordo com o DoJ, a Trafigura lucrou aproximadamente US$ 61 milhões com o esquema.

 

“A declaração de culpa destaca que quando empresas pagam propinas e minam o estado de direito, elas enfrentarão penalidades significativas”, disse em nota Nicole M. Argentieri, chefe da Divisão Criminal do Departamento de Justiça.

Em dezembro, a Trafigura já havia anunciado a reserva de US$ 127 milhões para cobrir uma possível multa do Departamento de Justiça dos Estados Unidos para encerrar uma investigação sobre “pagamentos indevidos” feitos pela empresa no Brasil.

 

Quem estava envolvido no caso?

 

O Departamento de Justiça dos Estados Unidos cita apenas um nome na minuta do acordo de confissão feito entre a Trafigura e o órgão: Rodrigo Berkowitz. A identidade dos demais envolvidos foi preservada pelo DoJ.

 

Berkowitz é brasileiro e trabalhou como trader de combustíveis para a Petrobras no Rio de Janeiro e em Houston, no Texas. Segundo o acordo de confissão, ele foi uma das pessoas que recebeu propina da Trafigura para garantir contratos da empresa com a estatal brasileira.

 

Berkowitz já havia sido acusado por esses crimes em 2023 e já tinha se declarado culpado de uma acusação de conspiração para lavagem de dinheiro em 2019.

 

g1 não conseguiu contato com a defesa de Berkowitz para comentar o assunto.

 

O g1 também entrou em contato com a Trafigura, o Departamento de Justiça dos Estados Unidos para saber quais outros nomes podem estar envolvidos no esquema, mas não houve nenhuma resposta até a última atualização desta reportagem.

 

Procurada, a Petrobras afirmou que não vai comentar o tema.

 

Por que os Estados Unidos estavam investigando o caso?

 

O caso estava sendo investigado nos Estados Unidos por conta da Lei de Práticas de Corrupção no Exterior (FCPA, na sigla em inglês).

 

A norma permite que a Justiça norte-americana investigue e condene quaisquer pessoas que tenham cometido um ato de corrupção envolvendo uma empresa estabelecida nos Estados Unidos e que tenha ações negociadas nas bolsas de valores do país.

 

Foto de 2012 mostra a fachada do prédio onde a empresa suíça Trafigura tem seus escritórios, em Genebra. — Foto: Reuters/Denis Balibouse/Foto de arquivo

 

57ª fase da Lava Jato

 

Em 2020, o Ministério Público Federal (MPF) propôs uma ação civil pública por improbidade administrativa contra empresas ligadas à Trafigura, executivos do grupo e ex-funcionários da Petrobras pelo pagamento de propinas.

 

O MPF apurava crimes que ocorreram entre maio de 2012 e outubro de 2013, em 31 operações de compra e venda internacional de petróleo e derivados, conhecida como trading.

 

Além da Trafigura, eram investigadas na 57ª fase da Lava Jato a Vitol e a Glencore. Juntas, elas seriam responsáveis por US$ 15 milhões em propinas. Os pagamentos estão relacionados a mais de 160 operações de compra e venda de derivados de petróleo e aluguel de tanques para estocagem.

 

Segundo o MPF, as provas mostram um esquema em que as empresas investigadas pagavam propina para ter mais facilidades nos negócios, como preços mais vantajosos e contratos mais frequentes.

 

De acordo com a investigação, a atividade criminosa permitia que as empresas conseguissem ganhos acima dos praticados pelo mercado. Também foram identificados indícios de irregularidades no aluguel de tanques de armazenagem da Petrobras pelas empresas investigadas, e no afretamento de navios.

 

A diretoria de Abastecimento da Petrobras, que foi comandada por Paulo Roberto Costa, era responsável pelo setor onde foram identificados os crimes investigados nessa fase.

 

O que diz a Trafigura?

 

Em comunicado divulgado na última quinta-feira (28), a Trafigura afirmou que o DoJ concedeu créditos à companhia por sua cooperação com a investigação e por ter demonstrado “reconhecimento e aceitação da responsabilidade”.

 

A empresa ainda informou que o DoJ reconheceu sua “decisão proativa” de encerrar o uso de agentes terceirizados para captação de negócios em 2019 e de desenvolver e implementar “políticas e procedimentos aperfeiçoados com base em riscos” para monitoramento anticorrupção e compliance ao tomar a decisão de não nomear um auditor independente.

 

Em nota, o presidente da Trafigura, Jeremy Weir, afirmou que os incidentes do passado “não refletem os valores” da empresa nem a conduta esperada de cada funcionário.

 

“São particularmente decepcionantes, considerando nossos esforços contínuos ao longo de muitos anos para incorporar uma cultura de conduta responsável da Trafigura”, disse Weir no documento.

 

O executivo ainda disse estar satisfeito com o reconhecimento dado pelo DoJ às medidas tomadas pela companhia para investir em seu programa de compliance.

 

“A melhoria contínua de nosso programa de compliance e os altos parâmetros de comportamento ético continuarão sendo prioridades para o Grupo”, completou.

 

*Com informações da agência de notícias Reuters.

 

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